Evento
3º Festival Cabobu chega a Pelotas para homenagear seus criadores
No próximo final de semana a cidade irá respirar a cultura negra da cidade, capitaneada pela festa dos tambores
Foto: Carlos Queiroz - DP - Produtora Sandra Narciza, coordenador pedagógico José Baptista e o mestre Griô Dilermando Freitas comemoram a realização do evento
Quando Giba Giba disse: “Está em extinção a matriz cultural negra em Pelotas: o tambor”, lá no longínquo ano de 1999, as palavras soaram com um tom de alerta e que algo precisava ser feito para manter viva a história do negro pelotense, na sua essência, na sua arte através Sopapo, hoje patrimônio imaterial da cidade. No mesmo ano surge o primeiro Festival Cabobu, a festa dos tambores. O evento marcou o cenário cultural de Pelotas também em 2000, até adormecer por 23 anos, quando ressurge no próximo final de semana com o patrocínio da Natura Musical. A 3ª edição do Festival Cabobu chega com a promessa de prestar homenagens a personalidades negras da história gaúcha e movimentar palcos e debates sobre a cultura negra. Na programação, shows musicais, espetáculos de dança, feira de arte, exposições, oficinas e mesas redondas, destacando a música, a cultura e a contemporaneidade da arte afro sul-rio-grandense.
A iniciativa é da produtora Sandra Narcizo, da MS2 Produtora, que esteve por anos ao lado do criador do Festival, compositor, percussionista e agitador, o mestre Giba Giba, que agora empresta o conhecimento e seu legado ao filho Edu Nascimento, integrante da comissão organizadora. No elenco desse grande projeto ainda estão José Baptista, que será o coordenador pedagógico do evento, e o mestre Griô Dilermando Freitas.
Com entrada franca para as atividades dos três dias, a expectativa de ambos não é expressa em palavras, mas no toque do tambor. “A trajetória do Cabobu começou em 1986 quando formou-se a comissão de pesquisa e eclodiu em 1999. Surpreendentemente ele (o festival) trouxe outros braços que não estavam programados no projeto original. Descobrimos então que a história do Sopapo carrega toda a cultura pelotense e toda a história de Pelotas. Esse é o grande barato”, contou José Baptista, que vai coordenar as oficinas e mesas redondas do evento.
Ele conta que o Sopapo existia desde 1780, sendo responsável pela cidadania do negro na cidade. “O tambor é o responsável por um negro ter formado uma sociedade, por hoje nós termos o direito e a liberdade de expôr o que nós pensamos, o que queremos e os nossos saberes”, esclareceu. Para Batista, a festa dos tambores descortina a história da cidade e envolve todos os povos. O coordenador se sente homenageado através da proposta das oficinas gratuitas de ritmos percussivos e de conservação de tambores, que serão realizadas em salas da Secretaria de Cultura de Pelotas (Secult) e que rememoram o trabalho de seu pai, Mestre Baptista (1936-2012) o luthier que confeccionou 40 sopapos para o projeto na primeira edição do evento. Na época, os instrumentos foram distribuídos para instituições como forma de multiplicar, replicar o som do tambor, símbolo do povo preto da cidade. Um dos pontos altos foi o cortejo com saída do Colégio Pelotense até o Centro da cidade, onde uma grande tamborada atraiu um grande público no Mercado Central.
Merecimento
Escolhido entre 3.720 inscritos, o edital do 3º Festival Cabobu ficou entre os 33 selecionados e é um dos setes festivais patrocinados pela Natura Musical. De acordo com Sandra, o projeto foi encaminhado por meio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura (LIC) do Rio Grande do Sul e conta com apoio da Prefeitura Municipal de Pelotas. Na lista dos patrocinados ainda estão projetos como: Dessa Ferreira, Pâmela Amaro, Circuito Orelhas, Gravina DasMina e Feijoada Turmalina.
“Temos o patrocínio da Natura, mas é o Procultura o nosso grande incentivador, pois este é um evento para todo o povo gaúcho, mas que precisa ser realizado aqui por ser o nascedouro do Sopapo, o grande agregador da cultura negra do povo”, salientou Sandra. A produtora vai além ao dizer que a festa do tambor em Pelotas é um grande encontro onde as pessoas possam se reconhecer, além de ser uma oportunidade de fala e de estabelecer diretrizes do que se quer na área do lazer, na área do conhecimento, na arte onde o negro está, mas não aparece. “Este é um festival interativo. Nós oferecemos a estrutura e o povo estabelece o que vai ser apresentado. Por isso é um evento que está sendo pensado há muito tempo, e agora, conseguimos dinheiro para efetivá-lo”, ressaltou. A grandeza do Festival Cabobu, para Sandra, é mensurada pela postura da LIC que considerou prioritário.
A origem do nome
Giba Giba precisava dar um nome ao evento que celebra o toque do tambor. Então pensou no nome dos três grandes percussionistas da época: Cacaio, Boto e Bucha e usou as duas primeiras letras dos nomes de cada um: CaBoBu. Quem conta essa história é o Mestre Griô Dilermando Freitas. “O som do tambor é a extensão do meu corpo. Ele é meu objeto de pesquisa e ressignifica a minha história na cidade. Um toque é como se eu me encontrasse com um Orixá, como se algum ancestral falasse comigo. O tambor me fortalece a cada momento”, contra ele ao lembrar que após abandonar o estudos dos 13 aos 20 anos, voltou para conhecer o seu lugar na história. “Hoje faço mestrado graças ao tambor”, disse emocionado o educador físico e também educador griô, formado em 2006 como mestre.
Homenagens
Os espaços que estão sendo preparados para o evento prestam homenagem às personalidades que marcam a realização do projeto Cabobu na cidade gaúcha, bem como representativos defensores dos saberes tradicionais dos negros. São eles: Palco Giba Giba, Espaço Oficina Mestre Baptista, Espaço mestra Griô Sirley Amaro, Ponto de Encontro mestre Caloca. Além da Feira Preta Helena do Sul.
O palco principal de espetáculos leva o nome de Giba Giba (falecido em 2014) e vai ocupar o Largo do Mercado Público de Pelotas. O músico pelotense foi o precursor do uso do tambor de sopapo na sonoridade regional gaúcha, dos ritmos carnavalescos à percussão no que é considerada a MPG (música popular gaúcha), com repercussão nacional de sua produção artística. Também recebe menção o músico percussionista Djalma Corrêa, grande incentivador do Festival, que faleceu no final de 2022. Djalma é padrinho do Cabobu, tendo em vida aceitado o convite e que agora permanece em sua honra.
Carregando matéria
Conteúdo exclusivo!
Somente assinantes podem visualizar este conteúdo
clique aqui para verificar os planos disponíveis
Já sou assinante
Deixe seu comentário